Rafael DM: “Quando ouço falar em parceria no metal já fico com o pé atrás”

Nos últimos anos, tenho visto proliferar diversas manifestações em prol do metal nacional. As iniciativas vão desde parcerias entre bandas e produtores, até apelos dramáticos com um toque de “não deixe o metal morrer, não deixe o metal acabar”.

O titio Ozzy afirmou, categórico, que enquanto houver jovens revoltados, o rock nunca deixará de existir. Mas isso não impede que o rock/metal se transforme. E com a chamada revolução tecnológica e o advento da sociedade informacional, essa mudança é severa e não deixa pedra sobre pedra (trocadilho não intencional). Por um lado, encaro certas atitudes como louváveis.

Por outro, não consigo deixar de enxergar algumas manifestações como um grito desesperado de caras que queriam muito ter a vida de rockstar, mansões, montanhas de drogas, limousines e mulheres fazendo fila de dobrar a esquina.

A música pesada, pra mim, é paixão. É sentida na medula, arrepia até o último pelo do rabo, levanta qualquer defunto. Em princípio, o metal pra mim não é um negócio. No entanto, sempre procurei enxergar o metal da forma mais profissional possível, como músico e como produtor de eventos. Ser profissional é a forma que encontrei de fazer com que minha paixão sobreviva.

Mas se me preocupo com a cena, se tenho interesse genuíno em ver o underground cada vez maior e mais prolífico, preciso antes pensar no que estou oferecendo, e não somente no que estou recebendo.

Quando ouço falar em parceria no metal, já fico com o pé atrás: É raro surgir um discurso que vá além de “compre MEUS discos, vá aos MEUS shows, babe o MEU ovo”. Amigos, peralá: desde criança aprendi que parceria é uma via de mão dupla. Parceria, no sentido de camaradagem mesmo, acontece quando você dá e recebe, quando uma mão lava a outra. Quando eu enfeito um discurso com palavras bonitinhas e motivacionais, que no fim têm tão somente a intenção de fazer com que VOCÊ consuma o que EU produzo, é demagogia pura.

Pode ser uma bela estratégia de negócio, que não cabe a mim avaliar se é moral ou não, mas não passa disso, demagogia. Business as usual! E pensando assim, fico ressabiado quando ouço falar de parceria. Quando vejo bandas nas quais os membros se detestam, mas que insistem em lançar trabalhos duvidosos, na esperança de angariar mais algumas moedas daqueles que ainda se deixam enganar.

Fico sem entender o que eu ganho numa parceria em que, em nome do metal nacional, vou num show, mas chego lá e sou obrigado a pagar 8 reais em 300ml de chopp de péssima qualidade. Sempre vejo donos de casas de show, organizadores de eventos e bandas se lamentando por infelizmente terem se rendido às bandas covers.

Discurso vazio! Já toquei em lugares em que a long neck de uma cerveja que custa 2.99 no supermercado custava 12 reais. Que público espero atingir com isso? O cara que tem condições de pagar 12 reais numa long neck, imagino, já está em outra pegada, provavelmente com estabilidade financeira, com filhos, etc. Pra mim fica claro que esse local não tem interesse no moleque de 16, 18 anos, que ama o metal nacional de paixão, que gasta sua mesada pra acompanhar as bandas que curte.

E é justamente NESSE moleque que está a esperança: É esse cara que vai montar banda, ir aos shows, festivais, mostrar som novo pros amigos na escola, fazer excursão e rodar 400 km só pra ver as bandas que curte. Aí vejo caras tentando ter 400% de lucro em um evento, e ficam abismados porque a molecada não comparece! É mole?! São esses os caras que vão lamuriar na internet, choramingar nostalgias de que a cena nacional é horrível e a molecada de hoje não tem atitude.

Eu boto fé nessa molecada. Tenho visto coisa nova acontecendo, uma galera com a mente mais aberta, com criatividade e ousadia, que lançarão as bases do que conheceremos como cena metal daqui uma década ou duas, quando nossos heróis de hoje já estiverem todos debaixo da terra.

E quem sabe, pra encher o vovô Dm do futuro de orgulho, essa cena seja de respeito, de parceria de verdade, via de mão-dupla, um jogo de ganha-ganha, em que o cheirinho podre de exploração sentido nos bastidores do metal por aí seja apenas uma lembrança ruim do passado, e nada mais.

E você, caro leitor? Já se sentiu lesado, com a sensação de fazer sua parte mas não ser correspondido? Conte nos comentários as suas experiências, e sinta-se livre pra concordar ou discordar, questionar ou trocar ideia a respeito!