Texto: Vitor Krohne – @vitor.krohne
Fotos: Leandro Oliveira – @leandro.oliveira.foto
Shawn James (Chicago, 1986) é um cantor, compositor e multi-instrumentista estadunidense cujas raízes se estendem até o blues, gospel, folk e rock. Dono de voz poderosa e carisma diferenciado, Shawn iniciou sua carreira em estúdios de música em Nashville no Tennessee e gravou seu primeiro álbum Shadows em 2013.
Já o amplo reconhecimento aconteceu quando a co-protagonista Ellie do game The Last of Us Part II, de 2020, apareceu cantando “Through the Valley” no trailer de revelação, tornando-se seu maior sucesso e projetando o artista mundialmente. Vale ressaltar também suas boas releituras de clássicos populares norte-americanos. Shawn também fundou sua banda The Shapeshifters com cinco álbuns de estúdio além dos sete lançamentos solo.
Vamos ao espetáculo. Já na fila me deparei com um público que facilmente encontraria na portaria de show de metal moderno ou rolê indie, o que evidencia a positiva ecleticidade da noite belorizontina. Dentro da casa, A Autêntica, em sua segunda encarnação, muito bem estruturada, uma das melhores da cidade, ajuntava-se um número convenientemente confortável para um senhor de trinta e poucos anos. Ambiente arejado, sonoridade cristalina, plateia animada, banda pontual.
A primeira música foi “Six Shells”, abrindo o show de forma impactante com Shawn no vocal e violão, acompanhado de sua banda, composta por Sage Cornelius no violino elétrico, Zack Sawyer no baixo e Rob Kennedy na batera. A excelente instrumentação adaptada para as apresentações ao vivo transformaram as faixas, por vezes acanhadas e introspectivas, em potentes e obscuras baladas folclóricas que me causaram arrepios diversas vezes. Ao meu redor, era visível que não era o único.
A segunda execução, “Curse of the Fold”, arrancou resposta igualmente intensa do público. Muitos cantavam junto com Shawn, fato que não cessou ao chegar à terceira música, “The Stones Cried Out”. Em seguida, veio “Thief and the Moon”. Definitivamente a banda detinha o controle anímico da plateia, e o fazia com maestria e carisma e já preparava o terreno para um momento de grandes emoções: “Eating Like Kings”.
Shawn tomou a atenção para si e narrou a história da canção, escrita por um amigo, soldado destacado no Afeganistão, e como uma boa história de guerra traz reflexões sobre a vida, morte, culpa e sanidade. O público se emocionou demais, chegando a cantar a cappella. O ponto mais alto da noite, se não houvessem tantos outros no páreo.
A sexta música, “I Want More”, aliviou um pouco as emoções com o swing do flamenco, evidenciando a ampla gama cultural de Shawn. Quando chegou o momento de “Burn the Witch”, uma das favoritas dos fãs, a reação foi explosiva. Cantada a plenos pulmões pela plateia, acompanhando Shawn em cada palavra, se construiu um outro grande momento muito bem ambientado.
Nesse ponto do show, Shawn apresentou sua banda. Era visível a descontração e real apreço em tocar na cidade e se apresentar para nós naquela ocasião, tais fatores criam um mojo, uma conexão artista-público que fazem a diferença e tornam certas noites memoráveis. Creio que Shawn consiga isso com boa frequência.
Após a apresentação da banda, seguiram com “Orpheus”, sem vacilação, e então veio “Muerte Mi Amor”, dando uma guinada no show em direção à veia acústica: o violão foi passado ao baixista. Shawn aproveitou para declamar sobre a morte, numa interação profunda com a plateia, que absorvia cada palavra em silêncio respeitoso. Em seguida, uma das performances mais intimistas da noite: “Through The Valley”, uma versão acústica tocante apenas com violino e violão. O público permaneceu atento e cativo, bem ambientado a esse formato.
A apresentação metamorfoseou novamente com o retorno completo da banda tocando a clássica “Ain’t No Sunshine”, de Bill Withers, de ritmo acústico para totalmente elétrico, cada vez mais pesado. Era a vez de sua interpretação de “Like a Stone”, do Audioslave, que cresceu até o clímax sonoro, destacando o carisma e talento do jovem violinista Cornelius.
A seguir, o show descendeu a níveis claramente mais densos, com “The Wanderer”. Agora experienciávamos heavy rock puro. Em “No Blood From a Stone”, ficava evidente a proficiência técnica e vocal dos instrumentistas, agora bem mais requisitados que outrora, com arranjos repletos de elementos de metal.
Para o rápido encore, a banda voltou com “Hellhound”, onde Shawn James exibiu seu lado mais heavy metal, incluindo até mesmo um surpreendente scream. A noite foi encerrada com “Haunted”, em versão mais pesada (e menos pasteurizada) que nas gravações.
Na realidade, posso garantir isso sobre todas as faixas do show, o que me surpreendeu positivamente. O artista domina o espetáculo, mantém a atenção do público e estabelece conexão do início ao fim, tornando assim, uma exibição de muito valor.
Apesar de ter sido um show relativamente corrido, devido à agenda apertada da banda com uma viagem muito próxima à Argentina, Shawn James e seus músicos interagiram com o público belorizontino com entusiasmo e muito bom humor, brincando entre as músicas, dedicaram tempo após a apresentação, tiraram fotos, distribuíram autógrafos e prometeram voltar o mais breve possível para mais uma noite grandiosa de dark folk e heavy metal.
Setlist:
Six Shells
Curse of the Fold
Stones Cried Out
Thief and the Moon
Eating Like Kings
I Want More
Burn the Witch
Orpheus
Muerte Mi Amor
Through the Valley
Ain’t No Sunshine
Like a Stone
The Wanderer
No Blood From a Stone
Hellhound
Haunted