Por Clinger Carlos
Diferente de muitas resenhas sobre festivais que todos encontram nos sites especializados, aqui vou eu contradizer o padrão e falar do que geralmente as resenhas não falam, que é negócio. Porque, além da minha paixão pela música pesada, pelos festivais, pelas viagens, eu também sou um apaixonado por negócio e quando se fala de negócio dentro do heavy metal, eu fico mais louco ainda!
Dentro desta minha loucura, quando eu estava no Wacken eu parei por alguns minutos e comecei a imaginar se eu fosse o dono do festival (Tomas Jensen, mas ele tem um sócio), e naquele momento onde tudo estava acontecendo a mil por hora, a chuva caindo com força, os bastidores lotados de músicos e funcionários, o pau quebrando nos vários palcos do festival e digo uma coisa: Eu me senti bem pra caramba só de pensar. Não pela grana, nem pelo poder, mas sim por fazer a roda girar tão perfeitamente com o nicho de mercado mais difícil de ganhar dinheiro no mundo da música, que é o heavy metal.
Porque tão grande?
Quando vou a um festival o que mais me chama a atenção, além das bandas, é a movimentação das pessoas, os deslocamentos do público de setor para setor e nisto o Wacken dá show. São muitos palcos, distantes um do outro, com bandas de estilos diferentes em horários iguais e muitas áreas de escape, já que eles têm uma topografia extremamente plana.
Quando fui no Rock in Rio 2001, com 100 mil pessoas em uma noite, fiquei bem decepcionado com os deslocamentos, pois quando chegou sete da noite, não tinha como andar mais pelo local, a massa de pessoas se debatiam umas com as outras. Tanto que no outro ano o organizador reduziu a capacidade em 15% e disse que o festival foi feito para as pessoas terem espaço para caminhar.
Mas a grandeza do Wacken ultrapassa nossa imaginação, pois vi coisas impressionantes, como por exemplo um caminhão de maças sendo descarregado nos bastidores do festival. Vi também uma estrutura de atendimento médico com várias ambulâncias, em certo momento contei 12, todas prontas para atender quem precisasse. Estrutura de atendimento muito maior que muita cidade pelo grande do Brasil.
Transformado os problemas em marketing
Ter um negócio é ter problema, qualquer empresa, por menor que seja existem diversos problemas diariamente e no Wacken notei que não era diferente.
Vale dizer que eu trabalho com levantamentos topográficos, então por onde passo tenho uma visão crítica do terreno, comparando sempre com a nossa realidade do Brasil e quando cheguei a pequena cidade de Wacken, logo notei um terreno extremamente plano e sem cursos d’água ao seu redor. E quando o terreno é assim e cai a chuva, o que acontece? A agua não escorre para lado nenhum e quando vem o pisoteio de milhares de pessoas vira lama e depois chove em cima da lama, ai não tem solução.
Então notei claramente, mesmo antes de ir ao festival, que os promotores tiveram que transformar todo aquele problema em propaganda, pois notamos claramente em todos os vídeos e peças promocionais do festival que eles dão ênfase a lama e a chuva. Percorrendo o festival pude ver muitos cartazes com fotos de pessoas encharcadas de lama, como se aquilo fosse realmente uma diversão fantástica, o que na realidade não é, na realidade é um puta problema, pois chega num ponto que você não consegue mais se deslocar, seu pé congela, o cansaço bate e aí você perde muita coisa, levando em conta que uma hora de estadia no Wacken no momento que tudo está funcionando fica bem caro e perder uma hora de festival teria me deixado puto pra caramba, mas eu resisti até o fim.
Estava eu conversado com um headbanger europeu e ele reclamou muito da lama no Wacken, disse que aquilo é um absurdo, que poderiam ter resolvido isto já e não resolvem, então perguntei a ele: Quantas vezes você já veio ao Wacken ? Ele me responde: Quatorze vezes. Pensei comigo: Putz, já pensou um cliente meu frustrado com minha empresa, mas me comprando a 14 anos, pra mim não seria nada mal.
E pelo que parece os organizadores não tem medo dos problemas, pois são organizadores de outros eventos complicados de ser administrar, como é o caso do Wacken Winter Nights, festival organizado no meio da neve, onde o ingresso é vendido juntamente com roupas especiais de inverno e equipamentos para skiar, além dos shows que rolam no meio daquele frio todo.
Os produtores sabem exatamente o que é fazer negócio.
Fazer bons negócios é fazer com que seu cliente sempre tenha vontade de voltar e no Wacken vi pessoas se programando para ir no festival do próximo ano, mesmo antes do festival deste ano iniciar. Na verdade, eles conseguiram criar não somente um conceito para o festival, mas sim uma adoração pelo festival, o que é bem diferente de uma simples estratégia comercial.
Tudo bem que a realidade europeia é outra, os caras ficam em casa num frio danado por 8 meses e quando pinta um verãozinho os caras saem para festivais. Mas o que tem de carro com adesivo do festival circulando pela Europa é brincadeira, os amantes do Wacken adesivam seus carros pra mostrar que fazem parte daquele conceito também.
Falando do atendimento, pra dizer a verdade, não senti que o Alemão é tão educado assim, parei em poucos lugares lá, mas as pessoas te atendem normalmente, sem muito bajulação, mas no Wacken a coisa é diferente, os caras atendem muito bem, desde o credenciamento até outros contatos que tivemos fomos muito bem atendidos, os organizadores sobem ao palco agradecem, fazem coletiva de imprensa, envolvem a comunidade local, fazem todo aquele bate bola, como se fosse um lance político mesmo. Muitas vezes senti isto mesmo, sabe aquele político do seu bairro que sempre dá um sorriso forçado para você quando lhe vê.
Legal mesmo são as atendentes das barracas, muitas delas quando te vê passando lançam seu sorriso pra tentar te capturar pra barraca dela e quando a gente menos imagina você já foi e já comprou uma comida chinesa ruim pra caralho(rsrs).
Os shows, os palcos, as bandas …
Quando vc consegue vender todos os ingressos do seu evento, antes de anunciar o cast das bandas, logicamente que as bandas não são o principal fator que leva o público até o seu festival. Então por mais inocente que somos, o Wacken não vai colocar Iron Maiden, Metallica e Black Sabbath num mesmo festival, sabe porque? Porque não precisa, os ingressos já estão esgotados e eles tem bandas relevantes e muito mais baratas e tenho certeza que muitas bandas tocam até de graça no festival.
Mas eu sempre observei uma coisa em festivais e no Wacken não foi diferente. As gravadoras que colocam suas bandas no evento, seguindo rigorosamente uma sequência que muitas vezes vão revezando durante os anos e imagino que eles devem ter uma cota por ano, tipo assim: da Nuclear Blast este ano tinha Eluveitie, Blind Guardian, Testament, Therion e mais um monte.
Da Century Media tínhamos Arch Enemy, Entombed AD, Borknagar, Triptykon, Orphaned Land e por aí vai. E se eu fosse apostar na próxima banda brasileira a se apresentar no Wacken, eu apostaria na Nervosa, pois hoje estão na Napalm Records, que também estava representada no festival com várias bandas do seu cast, como Devildriver por exemplo.
Mas a banda que me chamou atenção foi o Hamaton, eles tocaram duas vezes neste ano e quando anunciou as bandas de 2017 eles estavam lá novamente. Cheguei a conclusão que o Q.I. da banda é muito forte.
Vale uma observação importante: Os alemães amam as bandas da Alemanha, cantam todas as músicas, tanto nos palcos principais quanto nos palcos onde tocam as bandas locais, com todos aqueles instrumentos tradicionais. Se falar de umas bandas alemãs tipo Rammstein, os caras até choram.
Não tenho paciência nenhuma de ficar fazendo listas de melhor show, mas vou os cinco melhores shows que ví no Wacken: Twister Sister, Triptykon, Tsjuder, Unisonic e Entombed AD.
Sem nenhum problema? Não. Estamos falando de festival ao ar livre.
Falar que o Wacken é fantástico é fácil, mas não podemos deixar de destacar alguns problemas, que por mais profissionais e metódicos que sejam os alemães, não tem como evitar certas coisas, pois a intensidade é grande e os fatores climáticos são determinantes num festival ao ar livre.
Eu vi o Iron Maiden pela sexta vez e posso dizer que foi o pior show com relação a sonorização. A equipe da banda ficou com um palco por sua conta o dia todo, mas na hora do show caiu uma puta chuva, uma ventania louca e o som falhou demais, a voz de Bruce em certos momentos não chegava onde eu estava e a locomoção ficou impossível porque estava todo mundo alí pra ver a mesma banda na mesma hora.
Algumas coisas aconteciam comigo e eu ficava realmente observando tudo e dando risada muitas vezes. Os acessos as áreas dos palcos eram bem interessantes, em alguns momentos você entrava com sua mochila e sua câmera sem problema, meia hora depois você voltava no mesmo local e era barrado e tinha que dar explicações de tudo que estava em sua mochila. Isto é, não tinha um padrão, dependia da cara do freguês.
Mas nada disso ofusca o brilho do festival que é realmente fantástico estar lá e nunca dei ouvido para saudosistas que dizem: O Wacken já foi bom, agora o melhor é o Sweden Rock, Hellfest, etc. Não, o Wacken é muito bom sim e merece ter o mérito de maior do mundo, porque os caras se arriscaram, aprenderam com os erros, tomaram prejuízos e sobressaíram, sabem porquê? Porque são ótimos no quesito fazer negócio!