Distraught celebra 35 anos com lançamento do EP “Involution”; confira resenha

Três décadas e meia se passaram e não apagaram a gana do Distraught em tocar Thrash Metal. Desde 1990, quando surgiram em Porto Alegre com uma demo chamada “To Live Better”, a banda construiu um caminho visando criar algo próprio. Involution”, o primeiro lançamento da banda em formato EP, é fruto direto desse percurso e mostra uma banda que entende seu passado sem se limitar a ele.

Para entender Involution” é preciso entender a evolução (sem trocadilhos!) da banda nestes 25 anos. Entre 1990 e 1997, o Distraught soava mais próximo do Thrash tradicional. Nervous System”, debut lançado em 1998, deu o primeiro passo para consolidar a banda como parte importante do Metal gaúcho, mas foi com Infinite Abyssal” (2001) que surgiu uma assinatura. Nesse álbum, o grupo, que inaugurava uma formação nova, passou a fundir a velocidade e a agressividade do Thrash com elementos do Death Metal, sobretudo momentos com mais “quebradeira” e trabalhados. Esse híbrido trouxe um som mais encorpado e abriu espaço para experimentações que continuariam em discos posteriores.

“Behind the Veil” (2004) expandiu essa mistura, explorando, pela primeira vez, um tema central, a inquisição, resultando num disco inspirado, tanto liricamente quanto no som. A busca por temas mais complexos encontrou seu ápice em Locked Forever” (2015), um álbum conceitual baseado no livro-reportagem Holocausto Brasileiro. Ali, a banda mergulhou em um estudo profundo sobre desumanização e violência institucional, transformando essas ideias em um som pesado, condizente com o tema proposto.

De lá para cá, os lançamentos pontuais — singles, clipes e o álbum ao vivo Southern Screams Live” (2024) — serviram para manter a banda em atividade e, ao mesmo tempo, testar a nova formação. A entrada do baterista Thiago Caurio em 2022 trouxe nova energia ao grupo, e Involution” é o primeiro registro completo em estúdio com essa formação, ao lado de André Meyer (vocais), Ricardo Silveira e Everton Acosta (guitarras) e Alan Holz (baixo, que entrou em 2017).

Com cinco faixas em pouco mais de 20 minutos, o EP traduz o estágio atual desse som híbrido em mais um trabalho conceitual. Desta vez, os porto-alegrenses deram um significado para cada uma das músicas, representando os elementos naturais Terra, Água, Ar, Fogo e Aether. A produção de Involution” é pujante, privilegiando o peso e a clareza dos detalhes. Tudo soa onde exatamente deveria estar. O time por trás da produção contou com Renato Osorio e Benhur Lima, enquanto a arte da capa é assinada por Marcelo Vasco.

“Bloody Mines” abre com riffs e a bateria de Caurio dando a tônica, logo partindo para a velocidade, intercalando com passagens mais arrastadas ou cadenciadas, incluindo aí ótimas viradas de Caurio, que se mostrou inspirado nesta estreia. Os riffs e solos de Ricardo Silveira e Everton Acosta também merecem destaque, inclusive nos momentos mais calmos, que dão um contraponto à quebradeira. Uma música 100% Distraught. Com André Meyer no comando, “Extermination of Mother Nature” surge em um primeiro momento mais cadenciada, para depois liberar a fúria, num misto de Thrash/Death como comentado lá no início da resenha. Algo que chama a atenção são os arranjos percussivos, com Caurio simplesmente usando e abusando de sua técnica. A música fala sobre as enchentes que assolaram o Rio Grande do Sul no ano passado, um tema que por si só já renderia um álbum completo.

Na sequência temos “Aether”, uma faixa instrumental curta, de 1 minuto de duração, construída como uma ponte, com guitarras melódicas e uma atmosfera que contrasta com a agressividade das demais músicas. Os arranjos percussivos evocam elementos regionais, que podem ser ouvidos no restante do EP de forma integrada à porradaria. Ela prepara o terreno para “Truth Denied”, talvez a peça mais completa do EP, onde a alternância entre andamentos rápidos e seções mais cadenciadas sustenta uma letra sobre manipulação e negação da realidade. A execução mostra como a banda domina a variação de texturas de forma coesa e dinâmica. “Setfire” encerra o trabalho com riffs entrecortados e um vocal mais direto, deixando um gostinho de “quero mais”.

No final das contas, ouvir o EP dentro do contexto da discografia ajuda a perceber como a sonoridade criada a partir de Infinite Abyssal” se tornou um ponto de partida permanente. O Thrash Metal continua sendo a espinha dorsal, mas desde então a influência de Death Metal deixou de ser um elemento adicionado para se tornar parte da linguagem da banda. Em Involution”, essa fusão soa natural, sem necessidade de provar nada a ninguém. E soa melhor do que nunca. Resta aguardamos o próximo “full”, que se vier nessa pegada, honrará a tradição e a história da banda.

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