O Pagan Throne chega a 2025 com “Terra Dourada”, lançado pela Urubuz Records, consolidando uma carreira já marcada por trabalhos conceituais e voltados a temas históricos. Desde o início, a banda se destacou por unir uma sonoridade voltada ao Pagan/Black Metal a contextos épicos, e em álbuns anteriores como “The Way to the Northern Gates” (2019) e “Land of the Greeks” (2023) construiu atmosferas de batalha, sendo este último inteiramente inspirado na Grécia antiga.
Três anos depois do último álbum, o grupo tem seu olhar voltado para o Brasil e suas contradições históricas. Gravado no estúdio Dragon Quarter Audio, no Rio de Janeiro, entre janeiro e maio deste ano, o novo trabalho resgata episódios da independência, do abolicionismo, da imposição religiosa e das lendas indígenas, tudo transposto para a linguagem extrema que caracteriza a sonoridade da banda, com um toque cinematográfico.
A formação atual conta com Rodrigo Garm nos vocais, Renan Guerra nas guitarras, piano e orquestrações, Rafael Luís na guitarra e também responsável pela produção, Bruno Hage no baixo e Alexandre Daemortiis na bateria. A eles se somam participações de peso da cena nacional, como Lord Vlad (Malefactor) em “Os Donos Dessas Terras”, Guilherme de Siervi (Omega Blast) e Thiago Barbosa (Ereboros) em “Abolicionismo Imperial”, Thiago Caronte (Velho) em “A Luta Pela Dignidade” e Davi Sterminiun (Gangrena Gasosa), que acrescenta percussões em momentos importantes do álbum, como em “Caçador da Noite”.
O CD abre com a introdução “Pelas Vastas Florestas”, evocando a grandeza natural do país, para então mergulhar em “1822 – O Sol da Liberdade”, onde velocidade, guitarras afiadas e vocais ríspidos narram a independência do Brasil. “Os Donos Dessas Terras” (com ótimos arranjos orquestrais) e “A Cruz da Imposição” resgatam a memória dos povos originários, lembrando a violência da colonização e da catequização, enquanto “Abolicionismo Imperial” e “A Luta Pela Dignidade” tratam das cicatrizes deixadas pela escravidão e pela desigualdade social. “Abolicionismo…” destaca que a Lei Áurea não foi um “presente” da princesa Isabel, mas fruto da resistência dos escravizados e “A Luta…” mostra como o sistema colonial enriqueceu às custas da dor do povo negro e ressalta a resistência, como nos quilombos. Em contraponto, “Naiá das Águas” explora uma lenda indígena especifica da região amazônica, sobre a jovem Naiá, que se sacrifica em busca da lua e acaba transformada em vitória-régia. Quanta riqueza!
Destaque também para “Liberdade Ainda que Tardia” conecta Tiradentes e o ideal revolucionário mineiro do século XVIII às batalhas por autonomia que atravessam a história do país. A adição de ritmos regionais à música deu um toque especial. O encerramento surpreende: uma versão caprichada de “Tico Tico no Fubá”, um choro clássico de Zequinha de Abreu, imortalizado por Carmen Miranda, dando um clima especial e autenticamente brasileiro ao trabalho.
A arte de “Terra Dourada”, criada por Rômulo Dias, merece destaque. A capa mistura elementos do folclore, da natureza e da história do Brasil em uma cena carregada de simbolismo: de um lado, a figura do Curupira; de outro, Naiá, retratada com uma guerreira indígena armada com arco e flecha, em posição de defesa diante das caravelas que surgem no horizonte. Os portugueses estavam chegando e com eles um desafio que perdura até hoje para os povos originários. A sonoridade do álbum, como um todo, permeia entre o Black Metal, Heavy Metal e elementos sinfônicos aliados a ritmos regionais, mesclando agressividade e melodia de forma natural.
De uma forma geral, a banda conecta diversos fatos importantes, na qual independência, escravidão, mito e memória se entrelaçam. Se antes o Pagan Throne buscava inspiração em universos nórdicos ou na Grécia antiga, agora foca na riquíssima história e mitologia do Brasil. Uma segunda parte do álbum, ou até uma trilogia, seriam bem-vindos. “Terra Dourada” corre o risco de ser eleito um dos melhores álbuns deste ano, e olha que a concorrência está forte, como vimos até aqui em mais de vinte resenhas publicadas recentemente. Ouça e viaje pela nossa história.

